sábado, 1 de dezembro de 2012

Mulher Guerreira

Rangel Querino


Quem criou o mito que mulher é o sexo frágil com certeza não conhecia Maria das Graças Xavier, ou simplesmente Graça, de 49 anos. ‘Uma mulher guerreira’ como se auto-define, Graça é divertida, vaidosa, está sempre de bem com a vida, não dá espaço para a tristeza e os sentimentos ruins e vê sempre no próximo o seu lado bom. Além de uma grande profissional, ela ainda se desdobra no papel de dona de casa, esposa e mãe de dois filhos, sendo um deles portador de uma deficiência física e mental.

Assim como as mulheres retratadas nas obras de Jorge Amado, sempre marcantes como Tibéria, Otália, Tieta, Gabriela, Tereza Batista, são alguns exemplos de mulheres fortes e determinadas. Nesta entrevista, Graça conta um pouco da sua vida, do seu dia a dia e de como não se deixa abalar pelos problemas que encara diariamente.



Leia Jorge: Você se define como que tipo de mulher?

Graça: Sou uma mulher guerreira. Criar um filho com necessidades especiais, sem marido, ganhando pouco é ser uma baita de uma mulher. Uma mulher que luta pelos seus interesses, pelos seus ideais e das outras mulheres também.



LJ: Qual a relação que você faz da mulher de ontem com a de hoje?

G: Hoje, as mulheres estão mais atualizadas, mas faltam se enquadrar mais. Ainda existe mulher que não se respeita. Não aceito que nenhum homem levante a voz para uma mulher, que já quero tomar a frente. Quando me separei do meu primeiro marido, fiz um termo na separação que não queria pensão. Então, a mulher hoje precisa ainda se ver mulher e se valorizar. Não precisa viver sendo submissa.


LJ: Qual a diferença da Maria das Graças mãe, dona de casa para a Maria das Graças profissional?

G: Não vejo nem muita diferença. O mesmo carinho que eu tenho pelos meus filhos, tenho pelos meus colegas. Tenho 29 anos que trabalho e sou muito bem tratada, muito respeitada. Já passei por diversos lugares e sou acolhida. Nem posso fazer uma festa, porque tenho que chamar a Bahia inteira. (risos) Acho que todo mundo merece ser abraçado. 


LJ: Como é o seu dia a dia de trabalho?

G: É ótimo. Adoro abraçar e ser abraçada por meus colegas. Meu trabalho me faz movimentar isso aqui tudo. Vou visitando todos os meus colegas. Inimizade para mim não existe.


LJ: Apesar de uma pessoa alegre, bem humorada, vaidosa. Parece que a vida lhe reserva alguns percalços, que percalços são esses?

G: Tenho um filho especial de 22 anos com paralisia cerebral. E levo de forma tranquila, não trago problemas de ordem pessoal para  o trabalho e nem do trabalho para casa. Aprendi a ter um equilíbrio de saber como contornar essas coisas. Acho que a força do problema dele foi um aprendizado de vida, porque ele não anda, não fala, ele precisa ser cuidado como um bebê. Tenho que planejar minha vida. Tenho horário para me distrair, ir a praia, clube. Então é uma importância muito grande para mim, porque é uma superação: você ter o primeiro filho e, devido a um erro médico, ter uma paralisia cerebral, 48 horas depois de nascido.


LJ: Qual foi a sua reação quando você descobriu a deficiência dele?

G: Quando a médica me deu o diagnóstico, disse para eu me preparar, porque todas essas crianças com necessidades especiais elas não vivem muito tempo, com 10 anos elas morrem. Eu disse: ‘doutora, a gente está aqui para isso, para aceitar. Fui escolhida para ser mãe dele, então a gente vai levando.’ Depois, tive o prazer de levá-lo, com 18 anos, nessa mesma médica. Quando chegou lá que ela o viu, ela disse ‘graças a Deus!’ e eu disse: ‘Ele já tem 18 e vai até os 30’.


LJ: Você já sofreu/sofre preconceito?

G: Uma vez estava no shopping e vi uma senhora dizer assim: ‘coitadinho! Ele é doente’. Eu disse: ‘não. A senhora que é doente.’ Eu o olho normal. Todos normais. Mas, eu me sinto uma pessoa muito preparada para isso. As pessoas hoje são muito indiferentes.


LJ: Como você faz para conciliar a sua rotina de trabalho com os afazeres domésticos?

G: Encaro de forma normal. Tenho três horários. Primeiro, acordo de manhã, cuido do meu filho, que acostumei ele a trocar o dia pela noite, porque de noite estou em casa, então é a hora que eu posso dar maior assistência. Ele acorda nove horas. Dou banho, dou mingau e vou trabalhar. A noite, o trabalho é de dona de casa, e ainda acompanho meu outro filho de 13 anos. Na escola, às vezes não posso ir às reuniões, mas ligo para os diretores, dou uma criação excelente. Olho mochila, o dever, essas coisas. Nisso, tenho ainda que acordar quatro, cinco vezes à noite para trocar a fralda. Às vezes acordo na hora certa de trocar. E acordo feliz. E não faço nada por fazer, faço tudo com prazer.


LJ: Você tem sonhos que ainda deseja realizar?

G: Tenho um grande sonho que irei realizar com fé em Deus, de fazer uma faculdade, me formar em Estudos Sociais e me tornar uma grande assistente social. Eu ainda não realizei, por que as condições financeiras ainda não permitiram. É a única coisa que ainda preciso alcançar.

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