terça-feira, 13 de novembro de 2012

No livro de Jorge, o som de Dorival


A relação entre as canções de Dorival Caymmi e algumas passagens de um romance de Jorge Amado


Por Artur Queiroz


As obras de Jorge Amado são marcadas pela exaltação que o autor faz à Bahia e ao jeito baiano de ser. Quem não conhece a Bahia, consegue ter uma noção de cada lugar e de cada paisagem do livro por causa da preocupação de Jorge em descrever minuciosamente o ambiente. Quem é baiano e conhece bem os lugares mencionados pelo autor, consegue se projetar para o local e imaginar, como o diretor de um filme, cada cena.


Em alguns livros, além da projeção para o local onde as cenas se passam, também é possível ouvir a trilha sonora. E quem bem soube cantar as obras de Jorge foi Dorival Caymmi. No livro “Mar Morto”, por exemplo, muitas passagens fazem referência direta à canção “É Doce Morrer no Mar”. Nesta canção os versos “A noite que ele não veio foi de tristeza para mim. Saveiro voltou sozinho... Triste noite foi para mim”, “Saveiro partiu de noite e foi... Madrugada não voltou... O marinheiro bonito a sereia do mar levou” e “Nas ondas verdes do mar, meu bem, ele se foi afogar. Fez sua cama de novo no colo de Iemanjá” descrevem bem o pensamento das mulheres dos pescadores ao constatarem que seus maridos morreram no mar.


“Eu li Mar Morto muito pequena ainda. Muitos anos depois eu li novamente e descobri a relação das músicas dele (Dorival Caymmi) com a história do livro. É fantástico! Para cada passagem do livro há uma canção que se encaixa perfeitamente bem. Eles eram amigos e é como se eles estivessem se juntado para escrever Mar Morto, assim como também para poder compor ‘O Bem do Mar’, ‘Canção da Partida’ e tantas outras que tem essa mesma temática dos pescadores, da vida no mar...”. A constatação é da cantora, compositora e neta de Dorival Caymmi, Alice Caymmi.


Ao ouvir Canção da Partida, o pescador Lúcio Simões e sua mulher Joana Simões afirmam que Dorival Caymmi conhece bem a rotina de quem vive da pesca, como se ele tivesse sido mesmo um deles. Os versos “Se Deus quiser, quando eu voltar do mar um peixe bom eu vou trazer/ Meus companheiros também vão voltar e a Deus do céu vamos agradecer”, fazem uma bela descrição do sentimento de cada pescador ao pensar no desembarque na praia, quando os trabalhos no mar chegam ao fim.


Talvez a amizade entre Amado e Caymmi tenha influenciado na ligação tão forte do livro com as canções, mas o que realmente interessa é que certas passagens de Mar Morto fazem de maneira bem sutil um convite para que o leitor ouça as canções. Após a leitura da obra, as canções também podem funcionar como uma forma de cantarolar a história do amor de Guma por Lívia, o bem da terra, e Iemanjá, o bem do mar.

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