terça-feira, 13 de novembro de 2012

Desativação de internamento no Hospital Dom Rodrigo preocupa portadores de hanseníase


Letícia Rocha



 Internações foram absorvidas pelo Couto Maia, mas medida pode comprometer tratamento de portadores da Hanseníase



Um marco na região e referência no tratamento da hanseníase, o Hospital Especializado Dom Rodrigo de Menezes (HEDRM), em Águas Claras, teve seu setor de internamento desativado recentemente. O setor foi transferido para o Hospital Couto Maia, em Monte Serrat, ficando no local apenas o atendimento ambulatorial dos pacientes. 
A mudança descentralizou o atendimento voltado para o tratamento dos portadores da doença que fazia da unidade de saúde uma referência em todo o Estado. A medida seria o início da concretização do Instituto Couto Maia, uma união dos dois hospitais, a ser instalado onde atualmente funciona o Dom Rodrigo.

De acordo com o médico e vereador Jorge Jambeiro, especialista na doença e que atuou por mais de 20 anos no HEDRM convivendo de perto com os internos e com a luta dos portadores da hanseníase, a medida compromete o tratamento de referência. “O Estado está perdendo leitos e caminhando para trás. Os pacientes internados precisam de tratamento especializado, com médicos capacitados. Um infectologista, por exemplo, não é a mesma coisa de um “hansenólogo”. Essa desativação é um retrocesso”, critica. O ortopedista é pioneiro na Bahia na realização da cirurgia reabilitadora das sequelas da hanseníase, a neurólise ulnar.

Jambeiro comenta ainda que 25% a 40% dos pacientes atendidos em Salvador já chegam ao hospital com quadros muito avançados da doença. “Isto ocorre porque os sintomas iniciais são facilmente confundidos com doenças de pele e acabam sendo tratadas de forma errônea. Os pacientes são tratados ambulatoriamente, mas aqueles que necessitam de procedimentos cirúrgicos para reparação das sequelas precisam de internamento para recuperação, e sua referência era o Dom Rodrigo”.

A opinião é compartilhada por Simone Barros, gerente do posto de saúde de Boca da Mata e segunda secretária do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), núcleo Salvador/Bahia,. “O Dom Rodrigo é uma referência antiga no tratamento da doença. Tanto os pacientes daqui, como os que vêm do interior já têm uma história naquele lugar. Pros pacientes e pra Cajazeiras em si é uma perda muito grande. A vinda do Couto Maia pro bairro é bom para Cajazeiras, mas é importante não perder as referências do Dom Rodrigo, do lugar. Para ter um, não se precisa perder o outro”, opina ela.

 A assessoria de imprensa da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) rebateu as críticas afirmando que o tratamento da hanseníase é prioritariamente ambulatorial e as necessidades de internação são muito raras. “Devido a este número pequeno de internações e avaliando o custo-benefício de manter uma estrutura hospitalar para pouquíssimos pacientes, a Sesab definiu que estas internações seriam absorvidas pelo Hospital Couto Maia, após uma avaliação criteriosa por parte das duas unidades. O Couto Maia dispõe de uma equipe especializada, inclusive para tratar a hanseníase, pois a maior parte dos médicos são infectologistas, mas recebeu ainda reforço da equipe de profissionais que atuava na internação do D. Rodrigo”, diz a assessoria, em nota enviada por e-mail.

De acordo com o coordenador do Morhan/núcleo Salvador/Bahia, Názaro de Jesus Costa, a medida será positiva desde que se faça o que foi proposto em maio, na reunião com o coordenador nacional do Morhan e a equipe do Estado para tratar do assunto e da implantação do Instituto Couto Maia. Até meados de novembro, a entidade estava montando uma equipe para visitar os pacientes transferidos. “O mais importante é observar se estão felizes, as condições deles lá, observar se estão tendo alguma rejeição. Aqui eles tinham liberdade, lá não sabemos, e cabe ao Morhan daqui fiscalizar, ver como estão sendo tratados”, pontua.


O que é hanseníase


 A doença é causada pela contaminação do bacilo de Hansen (Mycobacterium Leprae). Entre os sintomas mais conhecidos estão aparecimento de manchas brancas ou avermelhadas com dormência no local, insensibilidade térmica ou ao toque e dor nos nervos que, com o agravamento, pode impedir o movimento dos membros atingidos. Uma das dificuldades que o médico e vereador Jambeiro aponta para a eliminação da doença é o tempo da descoberta do diagnóstico, pois os seus sintomas são facilmente confundidos com doenças de pele, e também. Outro problema: não se tem ainda uma vacina para a sua prevenção. “É importante lembrar que os portadores da doença, em geral, são estigmatizados pela sociedade, embora a transmissão da doença só ocorra através de contato íntimo e prolongado. A doença tem cura e o tratamento é feito gratuitamente”, explica o médico.

Área de Proteção:

 Sobre o Instituto ser erguido na área onde funciona o Dom Rodrigo, ainda há um alerta. Uma emenda aprovada e incluída no PDDU, por proposição do vereador Jambeiro, considerou a região do Dom Rodrigo uma Área de Proteção de Recursos Naturais (APRN), reduzindo as possibilidades de construção na área. A única chance de construção determinada é de um Núcleo de Educação Ambiental.

A assessoria da Secretaria de Saúde está ciente da situação e, segundo justificou, a ideia é construir o instituto na área onde já existe uma edificação. Mas o projeto foi submetido ao IMA e à Sucom e aguarda posicionamento destes órgãos.

Números da Hanseníase:

* A Bahia está entre as dez áreas de maior risco de detecção da Hanseníase no Brasil e apresenta um grau de endemicidade considerado alto;

* Em Salvador, alguns bairros e comunidades como São Cristóvão, Pernambués e Subúrbio Ferroviário apresentam grandes bolsões de infecção do bacilo causador da doença;

* São detectados 7 novos casos por dia no Dom Rodrigo;

* O Brasil precisa cumprir o acordo feito com a Organização Mundial da Saúde, de eliminar a doença;

* Em 2011, dados do Ministério da Saúde registram 2.800 novos casos no Estado;

* Na Bahia, as áreas de grande prevalência estão nos municípios de Seabra, Chapada Diamantina, e Juazeiro, no Norte do Estado.

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